terça-feira, 20 de setembro de 2011

INTELECTUAL, POLÍTICO E PARTIDO!


"Os intelectuais que se recusam a sujar as mãos engajando-se na política partidária, ou assumindo um cargo público, são como o cidadão que afastado da política se queixa da sua corrupção. Ao não se comprometer, contribuem para que nada mude."   

Texto recebido por e-mail do Ex-Blog do Cesar Maia [blogdocesarmaia@gmail.com]
                                                                          (Ivan Petrella, diretor acadêmico Fundação Pensar - La Nacion, 16)


1. Anos atrás, o dramaturgo e então ex-presidente da República Checa, Vaclav Havel, debateu com seu amigo, o escritor britânico Timothy Garton Ash, sobre o papel dos intelectuais na política. Eles se perguntaram se é possível ser um intelectual e um político ao mesmo tempo e responderam à pergunta de maneiras diferentes. Para Garton Ash existe uma relação contraditória entre o intelectual e o político. O dever do intelectual é encontrar a verdade e articulá-la da forma mais clara possível.  O político apresenta a parte da verdade que melhor convém ao partido, e não busca a verdade na sua totalidade.


2. Para Havel, os intelectuais são pessoas que dedicaram suas vidas para pensar sobre o mundo e seu país de maneira ampla, além da conjuntura imediata. Isso faz com que sejam pessoas que pensam em longo prazo, que também estão interessados em questões globais. Os intelectuais são, de acordo com Havel, a "consciência da sociedade". Para ele os verdadeiros intelectuais são aqueles que se identificam não com uma ideologia, mas com o futuro incerto da dignidade humana em um mundo turbulento. Tentam perceber o contexto mais amplo, reconhecendo que não existem soluções mágicas e buscando, humildemente, reorientar e melhorar a realidade.               

3. Havel, então, aceita a divisão entre intelectual e político proposta por Garton Ash. Reconhece que a política, por sua natureza, impõe o curto prazo em detrimento do longo prazo. Entende que a política é obrigada a buscar interesses grupais em detrimento dos interesses gerais, que a leva a dizer meias-verdades que satisfazem a maior quantidade possível de pessoas, ao invés de enfrentar a verdade necessária e por vezes incômoda. Descrita dessa forma, a política é o oposto da sensibilidade intelectual.                 

4. Mas para Havel, é justamente por isso que se deve incorporar intelectuais à política partidária; não só podem, mas devem participar, são necessários para criar uma política melhor. Os intelectuais que se recusam a sujar as mãos engajando-se na política partidária, ou assumindo um cargo público, são como o cidadão que afastado da política se queixa da sua corrupção. Ao não se comprometer, contribuem para que nada mude.                 

5. Essa participação "a la Havel", penso, consistiria em pelo menos duas tarefas. Primeiro, o intelectual deve ser a consciência de seu partido. Deve ser a voz crítica que vai impedir que se utilize de qualquer meio para se atingir o fim desejado. Um intelectual não pode tolerar que seu governo minta em relação as estatísticas mais básicas, não pode permitir o capitalismo de amigos, não pode concordar que se use o dinheiro público para financiar propaganda política ou comprar vontades.  Em segundo lugar, o intelectual deve rebelar-se contra uma compreensão da política como mera gestão das demandas do povo. Parte desta tarefa que pertence ao intelectual é ampliar imaginação política do partido, através da busca, em todo o mundo, de exemplos de políticas públicas transformadoras que poderiam ser aplicadas.                  

6. Assim, o intelectual deve responder a agressões com argumentos, e a argumentos com outros ainda melhores. Para isso, deve buscar colocar as ideias, os programas e – usando uma palavra da moda – os relatos no centro da cena. Sua ânsia por ideias faz parte de sua vocação pelo longo prazo; muitas vezes as ideias vivem mais e decepcionam menos do que as pessoas.

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